terça-feira, 27 de julho de 2010

VIDAS SECAS - GRACILIANO RAMOS - RESUMO DA OBRA

 Caros Amigos, dentre as obras indicadas para os vestibulares, talvez a mais lida seja Vidas Secas. Por seu caráter envolvente, de narrativa simples e empolgante, com a construção de personagens que retratam não somente a luta e a fortç dos retirantes nordestinos, mas para além da leitura, s nossas terras áridas construídas na lida diária. Cada personagem encontra identificação, espelho nas nossas próprias características e situações vivenciadas. Desta maneira, a história vai se configurando, à medida que nos refazemos e emocionamos, numa reconstrução dialética do nosso olhar sobre o ser humano e a sua relação consigo, com a terra e com o mundo. As relações de poder, entre dominantes e dominados se fazem presentes em diversos momentos da obra, bem como, os conflitos entre sentimentos, valores e sobrevivência. Vale à pena ler e assistir Vidas Secas. 

Como sugestão, registrem os sentimentos de vocês à medida que forem lendo, para que o diálogo com a obra possa ser aproveitado depois para maiores reflexões.

A seguir, uma resumo sobre a obra e o vídeo, para auxiliá-los no entendimento da narrativa.

Saudações Literárias!

 Os Retirantes - Portinari

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

Os abalos sofridos pelo povo brasileiro em torno dos acontecimentos de 1930, a crise econômica provocada pela quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, a crise cafeeira, a Revolução de 1930, o acelerado declínio do nordeste condicionaram um novo estilo ficcional, notadamente mais adulto, mais amadurecido, mais moderno que se marcaria pela rudeza, por uma linguagem mais brasileira, por um enfoque direto dos fatos, por uma retomada do naturalismo, principalmente no plano da narrativa documental, temos também o romance nordestino, liberdade temática e rigor estilístico.
Os romancistas de 30 caracterizavam-se por adotarem visão crítica das relações sociais, regionalismo ressaltando o homem hostilizado pelo ambiente, pela terra, cidade, o homem devorado pelos problemas que o meio lhe impõe.
Graciliano Ramos (1892-1953) nasceu em Quebrângulo, Alagoas. Estudou em Maceió, mas não cursou nenhuma faculdade. Após breve estada no Rio de Janeiro como revisor dos jornais "Correio da Manhã e A Tarde", passou a fazer jornalismo e política elegendo-se prefeito em 1927.
Foi preso em 1936 sob acusação de comunista e nesta fase escreveu "Memórias do Cárcere", um sério depoimento sobre a realidade brasileira. Depois do cárcere morou no Rio de Janeiro. Em 1945, integrou-se no Partido Comunista Brasileiro.
Graciliano estreou em 1933 com "Caetés", mas é São Berdado, verdadeira obra prima da literatura brasileira. Depois vieram "Angustia" (1936) e Vidas Secas (1938) inspirando-se em Machado de Assis.
Podemos justificar isto com passagens do texto:
"Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos."
"A caatinga estendia-se de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas"
"Resolvera de supetão aproveitá-lo (papagaio) como alimento..."
"Miudinhos, perdidos no deserto queimado, os fugitivos agarraram-se, somaram as suas desgraças e os seus       pavores".

ESTUDO DOS PERSONAGENS

Baleia - cadela da família, tratado como gente, muito querido pelas crianças.
Sinhá Vitória - mulher de Fabiano, sofrida, mãe de 2 filhos, lutadora e inconformada com a miséria em que vivem, trabalha muito na vida.
Fabiano - nordestino pobre, ignorante que desesperadamente procura trabalho, bebe muito e perde dinheiro no jogo.
Filhos - crianças pobres sofridas e que não tem noção da própria miséria que vivem.
Patrão - contratou Fabiano para trabalhar em sua fazenda, era desonesto e explorava os empregados.
Outros personagens: o soldado, seu Inácio (dono do bar).

ESTUDO DA LINGUAGEM

Tipo de discurso: indireto livre
Foco narrativo: terceira pessoa
Adjetivos, figuras de linguagem:
Metáfora: " - você é um bicho, Fabiano".
Prosopopéia: compara Baleia como gente

ANÁLISE DAS IDÉIAS

Comentário Crítico:
Esse livro retrata fielmente a realidade brasileira não só da época em que o livro foi escrito, mas como nos dias de hoje tais como injustiça social, miséria, fome, desigualdade, seca, o que nos remete a idéia de que o homem se animalizou sob condições sub-humanas de sobrevivência.

RESUMO DA OBRA

Mudança
Em meio à paisagem hostil do sertão nordestino, quatro pessoas e uma cachorrinha se arrastam numa peregrinação silenciosa _ _ . O menino mais velho, exausto da caminhada sem fim, deita-se no chão, incapaz de prosseguir, o que irrita Fabiano, seu pai, que lhe  dá estocadas com a faca no intuito de fazê-lo levantar. Compadecido da situação do pequeno, o pai toma-o nos braços e carrega-o, tornando a viagem ainda mais modorrenta _ .
A cadela Baleia acompanha o grupo de humanos agora sem a companhia do outro animal da família, um papagaio, que fora sacrificado na véspera a fim de aplacar a fome que se abatia sobre aquelas pessoas. Na verdade, era um papagaio estranho, que pouco falava, talvez porque convivesse com gente que também falava pouco _ _ .
Errando por caminhos incertos, Fabiano e família encontram uma fazenda completamente abandonada. Surge a intenção de se fixar por ali. Baleia aparece com um preá entre os dentes, causando grande alegria aos seus donos. Haveria comida. Descendo ao bebedouro dos animais, em meio à lama, Fabiano consegue água. Há uma alegria em seu coração, novos ventos parecem soprar para a sua família. Pensa em Seu Tomás da bolandeira.  Pensa na mulher e nos filhos.
A inesperada caça é preparada, o que garante um rápido momento de felicidade ao grupo. No céu, já escuro, uma nuvem - sempre um sinal de esperança. Fabiano deseja estabelecer-se naquela fazenda. Será o dono dela. A vida melhorará para todos _ .
Fabiano  
Em vão Fabiano procura por uma raposa. Apesar do fracasso da empreitada, ele está satisfeito. Pensa na situação da família, errante, passando fome, quando da chegada àquela fazenda. Estavam bem agora _ _ . Fabiano se orgulha de vencer as dificuldades tal qual um bicho. Agora ele era um vaqueiro, apesar de não ter um lugar próprio para morar. A fazenda aparentemente abandonada tinha um dono, que logo aparecera e reclamara a posse do local. A solução foi ficar por ali mesmo, servindo ao patrão, tomando conta do local. Na verdade, era uma situação triste, típica de quem não tem nada e vive errante.  Sentiu-se novamente um animal, agora com uma conotação negativa. Pouco falava, admirava e tentava imitar a fala difícil das pessoas da cidade. Era um bicho _ .
A uma pergunta de um dos filhos, Fabiano irrita-se. Para que perguntar as coisas? Conversaria com Sinha Vitória sobre isso. Essas coisas de pensamento não levavam a nada. Seu Tomás da bolandeira, apesar de admirado por Fabiano pelas suas palavras difíceis, não acabara como todo mundo? As palavras, as idéias, seduziam e cansavam Fabiano.
Pensou na brutalidade do patrão, a tratá-lo como um traste. Pensou em Sinha Vitória e seu desejo de possuir uma cama igual à de Seu Tomás da bolandeira. Eles não poderiam ter esse luxo, cambembes que eram. Sentiu-se confuso. Era um forte ou um fraco, um homem ou um bicho _ ? Sentia, por vezes, ímpeto de lutador e fraqueza de derrotado.
Lembrando dos meninos, novamente, achou que, quando as coisas melhorassem, eles poderiam se dar ao luxo daquelas coisas de pensar. Por ora, importante era sobreviver. Enquanto as coisas não melhorassem, falaria com Sinha Vitória sobre a educação dos pequenos.
Cadeia
Fabiano vai à feira comprar mantimentos, querosene e um corte de chita vermelha. Injuriado com a qualidade do querosene e com o preço da chita, resolve beber um pouco de pinga  na bodega de seu Inácio. Nisso, um soldado amarelo convida-o para um jogo de cartas. Os dois acabam perdendo, o que irrita o soldado, que provoca Fabiano quando esse está de partida. A idéia do jogo havia sido desastrosa. Perdera dinheiro, não levaria para casa o prometido. Fabiano, agora, pensava em como enganar Sinha Vitória, mas a dificuldade de engendrar um plano o atormentava.
O soldado, provocador, encara o vaqueiro e barra-lhe a passagem. Pisa no pé de Fabiano que, tentando contornar a situação à sua maneira, agüenta os insultos até o possível, terminando por xingar a mãe do soldado amarelo. Destacamento à sua volta. Cadeia. Fabiano é empurrado, humilhado publicamente.
No xadrez, pensa por que havia acontecido tudo aquilo com ele. Não fizera nada, se quisesse até bateria no mirrado amarelo, mas ficara quieto. Em meio a rudes indagações, enfureceu-se, acalmou-se, protestou inocência _ . Amolou-se com o bêbado e com a quenga que estavam em outra cela. Pensou na família. Se não fosse Sinha Vitória e as crianças, já teria feito uma besteira por ali mesmo. Quando deixaria que um soldadinho daqueles o humilhasse tanto? Arquitetou vinganças, gritou com os outros presos e, no meio de sua incompreensão com os fatos, sentiu a família como um peso a carregar _ .
Sinha Vitória
Naquele dia, Sinha Vitória amanhecera brava. A noite mal dormida na cama de varas era o motivo de sua zanga. Falara pela manhã, mais uma vez, com Fabiano sobre a dificuldade de dormir naquela cama. Queria uma cama de lastro de couro, como a de Seu Tomás da bolandeira, como a de pessoas normais.
Havia um ano que discutia com o marido a necessidade de uma cama decente e, em meio a uma briga por causa das "extravagâncias" de cada um, Sinha Vitória certa vez ouviu Fabiano dizer-lhe que ela ficava ridícula naqueles sapatos de verniz, caminhando como um papagaio, trôpega, manca. A comparação machucou-a _ .
Agora, ela irritava-se com o ronco de Fabiano ao lembrar-se de suas palavras. Circulando pela casa, fazia suas tarefas em meio a reza e a atenção ao que acontecia lá fora. Por pensar ainda na cama e na comparação maldosa de Fabiano, quase esqueceu de pôr água na comida. Veio-lhe a lembrança do bebedouro em que só havia lama. Medo da seca. Olhou de novo para seus pés e inevitavelmente achou Fabiano mau _ . Pensou no papagaio e sentiu pena dele _ .
Lá fora, os meninos brincavam em meio à sujeira. Dentro de casa, Fabiano roncava forte, seguro, o que indicava a Sinha Vitória que não deveria haver perigo algum por ali. A seca deveria estar longe _ . As coisas, agora, pareciam mais estáveis, apesar de toda a dificuldade. Lembrou-se de como haviam sofrido em suas andanças. Só faltava uma cama. No fundo, até mesmo Fabiano queria uma cama nova.

O Menino mais novo 
A imagem altiva do pai foi que lhe fez surgir a idéia. Fabiano, armado como vaqueiro, domava a égua brava com o auxílio de Sinha Vitória. O espetáculo grosseiro excitava o menor dos garotos, impressionado com a façanha do pai e disposto a fazer algo que também impressionasse o irmão mais velho e a cachorra Baleia _ . No dia seguinte, acordou disposto a imitar a façanha do pai. Para tanto, quis comunicar a intenção ao mano, mas evitou, com medo de ser ridicularizado.
Quando as cabras foram ao bebedouro, levadas pelo menino mais velho e por Baleia,  o pequeno tomou o bode como alvo de sua ação. Sentia-se altivo como Fabiano quando montava. No bebedouro, o garoto despencou da ribanceira sobre o animal, que o repeliu. Insistente, tentou se aprumar mas foi sacudido impiedosamente, praticando um involuntário salto mortal que o deixou, tonto, estatelado ao chão. O irmão mais velho ria sem parar do ridículo espetáculo, Baleia parecia desaprovar toda aquela loucura _ . Fatalmente seria repreendido pelos pais. Retirou-se humilhado, alimentando a raivosa certeza de que seria grande, usaria roupas de vaqueiro, fumaria cigarros e faria coisas que deixariam Baleia e o irmão admirados.
O Menino mais velho
Aquela palavra tinha chamado a sua atenção: inferno. Perguntou à Sinha Vitória, vaga na resposta. Perguntou a Fabiano, que o ignorou. Na volta à Sinha Vitória, indagou se ela já tinha visto o inferno. Levou um cascudo e fugiu indignado. Baleia fez-lhe companhia tentando alegrá-lo naquela hora difícil.
Decidiu contar à cachorrinha uma história, mas o seu vocabulário era muito restrito, quase igual ao do papagaio que morrera na viagem _ . Só Baleia era sua amiga naquele momento. Por que tanta zanga com uma palavra tão bonita ? A culpa era de Sinha Terta, que usara aquela palavra na véspera, maravilhando o ouvido atento do garoto mais velho.
Olhou para o céu e sentiu-se melancólico. Como poderiam existir estrelas? Pensou novamente no inferno. Deveria ser, sim, um lugar ruim e perigoso, cheio de jararacas e pessoas levando cascudos e pancadas com a bainha da faca _ . Sempre intrigado, abraçou-se à Baleia como refúgio _ .
Inverno
Todos estavam reunidos em volta do fogo, procurando aplacar o frio causado pelo vento e pela água que agitava a paisagem fora da casa. Chegara o inverno, e isso reunia a família próxima à fogueira. Pai e mãe conversavam daquele jeito de sempre, estranho, e os meninos, deitados, ficavam ouvindo as histórias inventadas por Fabiano, de feitos que ele nunca tinha realizado, aventuras nunca vividas. Quando o mais velho levantou-se para buscar mais lenha, foi repreendido severamente pelo pai, aborrecido pela interrupção de sua narrativa.
A chuva dava à família a certeza de que a seca não chegaria por enquanto. Isso alegrava Fabiano. Sinha Vitória, porém, temia por uma inundação que os fizesse subir ao morro, novamente errantes. A água, lá fora, ampliava sua invasão.
Fabiano empolgava-se mais ainda em contar suas façanhas _ . A chuva tinha vindo em boa hora. Após a humilhação na cidade, decidira que, com a chegada da seca, abandonaria a família e partiria para a vingança contra o soldado amarelo e demais autoridades que lhe atravessassem o caminho. A chegada das águas interrompera aqueles planos sinistros. Em meio à narrativa empolgada, Fabiano imaginava que as coisas melhorariam a partir dali; quem sabe, Sinha Vitória até pudesse ter a cama tão desejada.
Para o filho mais novo, o escuro e as sombras geradas pela fogueira faziam da imagem do pai algo grotesco, exagerado. Para o mais velho, a alteração feita por Fabiano na história que contava era motivo de desconfiança. Algo não cheirava bem naquele enredo _ . Sempre pensativo, o menino mais velho dormiu pensando na falha do pai e nos sapos que estariam lá fora, no frio.
Baleia, incomodada com a arenga de Fabiano, procurava sossego naquela paisagem interior. Queria dormir em paz, ouvindo o barulho de fora _ .
Festa
A família foi à festa de Natal na cidade. Todos vestidos com suas melhores roupas, num traje pouco comum às suas figuras, o que lhes dava um ar ridículo. A caminhada longa tornava-se ainda mais cansativa por causa daquelas roupas e sapatos apertados. O mal-estar era geral, até que Fabiano cansou-se da situação e tirou os sapatos, metendo as meias no bolso, livrando-se ainda do paletó e da gravata que o sufocava. Os demais fizeram o mesmo. Voltaram ao seu natural. Baleia juntou-se ao grupo _ .
Chegando à cidade, foram todos lavar-se à beira de um riacho antes de se integrarem à festa. Sinha Vitória carregava um guarda-chuva. Fabiano marchava teso. Os meninos maravilham-se, assustados, com tantas luzes e gente. A igreja, com as imagens nos altares, encantou-os mais ainda. O pai espremia-se no meio da multidão, sentindo-se cercado de inimigos. Sentia-se mangado por aquelas pessoas que o viam em trajes estranhos à sua bruta feição. Ninguém na cidade era bom. Lembrou-se da humilhação imposta pelo soldado amarelo quando estivera pela última vez na cidade.
A família saiu da igreja e foi ver o carrossel e as barracas de jogos. Como Sinha Vitória negou-lhe uma aposta no bozó, Fabiano afastou-se da família e foi beber pinga _ . Embriagando-se, foi ficando valente. Imaginava, com raiva, por onde andava o soldado amarelo. Queria esganá-lo. No meio da multidão, gritava, provocava um inimigo imaginário _ . Queria bater em alguém, poderia matar se fosse o caso _ . Vez ou outra, interrompia suas imprecações para uma confusa reflexão. Cansado do seu próprio teatro, Fabiano deitou no chão, fez das suas roupas um travesseiro e dormiu pesadamente.
Sinha Vitória, aflita, tinha que olhar os meninos, não podia deixar o marido naquele estado. Tomando coragem para realizar o que mais queria naquele momento, discretamente esgueirou-se para uma esquina e ali mesmo urinou. Em seguida, para completar o momento de satisfação, pitou num cachimbo de barro pensando numa cama igual à de seu Tomas da bolandeira .
Os meninos também estavam aflitos. Baleia sumira na confusão de pessoas, e o medo de que ela se perdesse e não mais voltasse era grande. Para alívio dos pequenos, a cachorrinha surge de repente e acaba com a tensão. Restava, agora, aos pequenos, o maravilhamento com tudo de novo que viam. O menor perguntou ao mais velho se tudo aquilo tinha sido feito por gente. A dúvida do maior era se todas aquelas coisas teriam nome. Como os homens poderiam guardar tantas palavras para nomear as coisas _ ?
Distante de tudo, Fabiano roncava e sonhava com soldados amarelos.
Baleia
Pêlos caídos, feridas na boca e inchaço nos beiços debilitaram Baleia de tal modo que Fabiano achou que ela estivesse com raiva. Resolveu sacrificá-la. Sinha Vitória recolheu os meninos, desconfiados,  a fim de evitar-lhes a cena.
Baleia era considerada como um membro da família, por isso os meninos protestaram, tentando sair ao terreiro para impedir a trágica atitude do pai. Sinha Vitória lutava com os pequenos, porque aquilo era necessário, mas aos primeiros movimentos do marido para a execução, lamentou o fato de que ele não tivesse esperado mais para confirmar a doença da cachorrinha.
Ao primeiro tiro, que pegou o traseiro da cachorra e inutilizou-lhe uma perna, as crianças começaram a chorar desesperadamente.
Começou, lá fora, o jogo estratégico da caça e do caçador. Baleia sentia o fim próximo, tentava esconder-se e até desejou morder Fabiano. Um nevoeiro turvava a visão da cachorrinha, havia um cheiro bom de preás. Em meio à agonia, tinha raiva de Fabiano, mas também o via como o companheiro de muito tempo. A vigilância às cabras, Fabiano, Sinha Vitória e as crianças surgiam à Baleia em meio a uma inundação de preás que invadiam a cozinha _ . Dores e arrepios. Sono. A morte estava chegando para Baleia.
Contas
Fabiano retirava para si parte do que rendiam os cabritos e os bezerros. Na hora de fazer o acerto de contas com o patrão, sempre tinha a sensação de que havia sido enganado. Ao longo do tempo, com a produção escassa, não conseguia dinheiro e endividava-se.
Naquele dia, mais uma vez Fabiano pedira a Sinha Vitória para que ela fizesse as contas. O patrão, novamente, mostrou-lhe outros números. Os juros causavam a diferença, explicava o outro. Fabiano reclamou, havia engano, sim senhor, e aí foi o patrão quem estrilou. Se ele desconfiava, que fosse procurar outro emprego. Submisso, Fabiano pediu desculpas e saiu arrasado, pensando mesmo que Sinha Vitória era quem errara.
Na rua, voltou-lhe a raiva. Lembrou-se do dia em que fora vender um porco na cidade e o fiscal da prefeitura exigira o pagamento do imposto sobre a venda. Fabiano desconversou e disse que não iria mais vender o animal. Foi a uma outra rua negociar e, pego em flagrante, decidiu nunca mais criar porcos _ .
Pensou na dificuldade de sua vida. Bom seria se pudesse largar aquela exploração. Mas não podia! Seu destino era trabalhar para os outros, assim como fora com seu pai e seu avô.
As notas em sua mão impressionavam-no. "Juros", palavra difícil que os homens usavam quando queriam enganar os outros. Era sempre assim: bastavam palavras difíceis para lograr os menos espertos. Contou e recontou o dinheiro com raiva de todas aquelas pessoas da cidade. Sinha Vitória é que entendia seus pensamentos.
Teve vontade de entrar na bodega de seu Inácio e tomar uma pinga. Lembrou-se da humilhação passada ali mesmo e decidiu ir para casa. o céu, várias estrelas. Deixou de lado a lembrança dos inimigos e pensou na família. Sentiu dó da cachorra Baleia. Ela era um membro da família.
O Soldado Amarelo
Procurando uma égua fugida, Fabiano meteu-se por uma vereda e teve o cabresto embaraçado na vegetação local. Facão em punho, começou a cortar as quipás e palmatórias que impediam o prosseguimento da busca. Nesse momento, depara-se com o soldado amarelo que o humilhara um ano atrás _ . O cruzar de olhos e o reconhecimento durou fração de segundos. O suficiente para que Fabiano esfolasse o inimigo. O soldado claramente tremia de medo. Também reconhecera o desafeto antigo e pressentia o perigo.
Fabiano irritou-se com a cena. O outro era um nadica. Poderia matá-lo com as mãos, sem armas, se quisesse. A fragilidade do outro aos poucos foi aplacando a raiva de Fabiano. Ponderou que ele mesmo poderia ter evitado a noite na cadeia se não tivesse xingado a mãe do amarelo. No meio daquela paisagem isolada e hostil, só os dois, e se ele pedisse passagem ao soldado? Aproximou-se do outro pensando que já tinha sido mais valente, mais ousado. Na verdade, na fração de segundo interminável Fabiano ia descobrindo-se amedrontado. Se ele era um homem de bem, para que arruinar a sua vida matando uma autoridade? Guardaria forças para inimigo maior.
Sentindo o inimigo acovardado, o soldado ganhou força. Avançou firme e perguntou o caminho. Fabiano tirou o chapéu numa reverência e ainda ensinou o caminho ao amarelo.
O Mundo Coberto de Penas
A invasão daquele bando de aves denunciava a chegada da seca. Roubavam a água do gado, matariam bois e cabras. Sinha Vitória inquietou-se. Fabiano quis ignorar, mas não pôde; a mulher tinha razão. Caminhou até o bebedouro, onde as aves confirmavam o anúncio da seca. Eram muitas. Um tiro de espingarda eliminou cinco, seis delas, mas eram muitas. Fabiano tinha certeza, agora, de uma nova peregrinação, uma nova fuga.
Era só desgraça atrás de desgraça. Sempre fugido, sempre pequeno. Fabiano não se conformava, pensava com raiva no soldado amarelo, achava-se um covarde, um fraco. Irado, matou mais e mais aves. Serviriam de comida, mas até quando ? Quem sabe a seca não chegasse...Era sempre uma esperança. Mas o céu escuro de arribações só confirmava a triste situação _ . Elas cobriam o mundo de penas, matando o gado, tocando a ele e à família dali, quem sabe comendo-os.
Recolheu os cadáveres das aves e sentiu uma confusão de imagens em sua cabeça. Aquele lugar não era bom de se viver. Lembrou-se de Baleia, tentou se convencer de que não fizera errado em matá-la, pensou de novo na família e no que as arribações representavam. Sim, era necessário ir embora daquele lugar maldito _ . Sinha Vitória era inteligente, saberia entender a urgência dos fatos.
Fuga
O céu muito azul, as últimas arribações e os animais em estado de miséria indicavam a Fabiano que a permanência naquela fazenda estava esgotada. Chegou um ponto em que, dos animais, só sobrou um bezerro, que foi morto para servir de comida na viagem que se faria no dia seguinte.
Partiram de madrugada, abandonando tudo como encontraram. O caminho era o do sul. O grupo era o mesmo que errava como das outras vezes. Fabiano, no fundo, não queria partir, mas as circunstâncias convenciam-no da necessidade.
A vermelhidão do céu, o azul que viria depois assustavam Fabiano _ . Baleia era uma imagem constante em seus confusos pensamentos. Sinha Vitória também fraquejava. Queria, precisava falar _ . Aproximou-se do marido e disse coisas desconexas, que foram respondidas no mesmo nível de atrapalhação.

Na verdade, ele gostou que ela tivesse puxado conversa. Ela tentou animar o marido, quem sabe a vida fosse melhor, longe dali, com uma nova ocupação para ele. Marido e mulher elogiam-se mutuamente; ele é forte, agüenta caminhar léguas, ela, tem pernas grossas e nádegas volumosas, agüenta também. A cidade, talvez, fosse melhor. Até uma cama poderiam arranjar. Por que haveriam de viver sempre como bichos fugidos _ ?
Os meninos, longe, despertavam especulações ao casal. O que seriam quando crescessem? Sinha Vitória não queria que fossem vaqueiros. O cansaço ia chegando à medida que avançava a caminhada, e assim houve uma parada para descanso. Novamente marido e mulher conversavam, fazendo planos, temendo o mau agouro das aves que voavam no céu.
Sinha Vitória acordou os pequenos, que dormiam, e seguiu-se viagem. Fabiano ainda admirou a vitalidade da mulher. Era forte mesmo! Assim, a cada passo arrastado do grupo um mundo de novas perspectivas ia sendo criado. Sinha Vitória falava e estimulava Fabiano. Sim, deveria haveria uma nova terra, cheia de oportunidades, distante do sertão a formar homens brutos e fortes como eles.
FONTE: 

quinta-feira, 8 de julho de 2010

HORA DO CONTO

Caros amigos,
Nunca me apropriei tanto de um conto quanto desse. Esta sensação se deu quanto terminei de ler O Caçador de Pipas. Ao terminar de ler, deitei de bruços na cama, com o livro docemente acolhido sob minha cabeça, como se fosse travesseiro ou o peito da pessoa amada. Fiquei ali algum tempo ruminando, sentindo as palavras ditas, a narrativa, as personagens vividas no meu coração, as frases mais fortes: "Você pode ser bom denovo" e "Por você faria isso mil vezes". Nossa, a paixão pela obra, pela história e tudo que nela contém me fez lembrar este conto de Clarice, o qual já era outra paixão literária há muito tempo, mas nunca tão vivenciada quanto agora.  Por isso, compartilho com vocês o conto e os provoco para ler também, O Caçador de Pipas, de Khaled Housseini.

 

Boa Leitura
Saudações Literárias


FELICIDADE CLANDESTINA - CLARICE LISPECTOR



Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e "saudade". Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia. Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria. Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança da alegria: eu nao vivia, eu nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam. No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez. Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono de livraria era tranqüilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte"com ela ia se repetir com meu coração batendo. E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra. Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. As vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados. Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler! E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: "E você fica com o livro por quanto tempo quiser." Entendem? Valia mais do que me dar o livro: "pelo tempo que eu quisesse" é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer. Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo. Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada. As vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante. ***

segunda-feira, 28 de junho de 2010

A Correspondência de Fradique Mendes, de Eça de Queirós


"Todo o jornal destila intolerância, como um alambique destila álcool, e cada manhã a multidão se envenena aos goles com esse veneno capcioso.”

Caros Amigos,
Com estas e outras hipérboles, a imagem de Fradique Mendes vai se tecendo como alguem de moral diferente, de pensamento e olhar a frente do seu tempo. Uma percepção ora árida ora exuberante sobre as relações, os valores e a sociedade. Vale à pena ler e enveredar nas armadilhas criadas por Eça de Queirós, nas palavras do Fradique Mendes.
Veja a seguir algumas pesquisas realizadas, mas leia toda a obra e dialogue com o autor, se indigne, se apaixone, ame ou odeie, mas leia.

O romance A correspondência de Fradique Mendes, de Eça de Queirós, aborda o contexto de Portugal.

Fradique é um verdadeiro heterônimo de Eça, sendo óbvias as semelhanças ideológicas com o seu criador, é um documento de própria trajetória existencial e psicológica de Eça.

Tal como descreve Eça, Fradique era um aventureiro, atormentado diante das injustiças sociais e da decadência da sociedade lusitana causada pelas constantes
transformações sociais, políticas e econômicas. Fradique foi um veemente crítico da sociedade lusitana, que não se deixou abater pela força das formas totalitárias, um incansável reconstrutor de um Portugal novo. Esse ser que Eça disse ter feito com pedaços de seus amigos é um ser plasmado com os anseios e ideais de uma geração de escritores que representava a vanguarda intelectual portuguesa do final do século XIX.

Era um grande homem, uma idealização de um conceito de humanidade cosmopolita, ainda que de raiz provinciana. Nasceu na Ilha Terceira, possivelmente por volta de 1867, tendo à data das cartas 33 anos. Por morte prematura dos pais, Fradique foi educado pela avô - D. Angelina Fradique, com a presença constante de um frade beneditino, de um coronel francês e um alemão que lhe fala de Kant. Aos 16 anos entra para a Universidade, sendo colega (virtual) de Antero e Eça. Em 1867 já era um homem viajado e experiente, um modelo para os demais intelectuais da Geração de 70. Fradique tem preocupações de ordem social e política.

Carácter enigmático e um pouco controverso, interessado e observador. Romântico pela primeira educação, orientalista, trotamundos, "touriste" da inteligência, «homem que passa, infinitamente curioso e atento», «superiormente apetrechado para triunfar na Arte e na Vida, ele constitui um juiz do mundo e da sociedade portuguesa. Um revolucionário, educado, robusto, culto, de bom gosto, mas também um desiludido, um pessimista.

Em rigor, Fradique Mendes pode ser considerado 3 personagens: a primeira é um heterônimo coletivo criado entre 1868 e 1869, por Jaime Batalha Reis, Antero de Quental e Eça, no tempo do Cenáculo de Lisboa. A segunda, surge episodicamente em O Mistério da Estrada de Sintra, em 1870, e finalmente a que Eça retoma individualmente com a publicação de Correspondência de Fradique Mendes, em 1888-1900.

Eça: "Este novo Fradique que eu relevo é diferente - verdadeiro grande homem, pensador original. Temperamento indicado às ações fortes, alma requintada e sensível".

Aristocrata rico, descendente de antigos navegadores, de uma "velha e rica família dos Açores". Estudara em Coimbra e em Paris. Acompanhou Garibaldi na conquista da duas Sicílias. Com 34 anos, fez parte do Estado-Maior de Napier, na campanha de Abissínia. Era "o português mais interessante do século XIX", com "curiosas parecências com Descartes". Mas faltava-lhe um objectivo definido na vida. Lia Sófocles, conhecedor de muitas línguas, entre as quais francês, alemão, inglês e até um pouco de árabe.

Expressão de uma incontida admiração pela figura do gentleman, personificação simbólica de uma elite intelectual que se opunha à vulgaridade e à chateza de um país em declínio, Eça, através de Fradique, tornou evidente também essa oposição pela sátira e pela critica: às liturgias que atravancavam e contrariavam o puro espírito com que as religiões se deveriam exprimir, à vacuidade de certos políticos do parlamento (carta ao Sr. Mollinet, onde retracta Pacheco), a um certo tipo de capitalistas (carta a Mme de Jouarre, onde retracta o Comendador Pinho) e ainda à classe eclesiástica portuguesa, inteiramente vinculada e dependente do estado, personificada genericamente no "horrendo" Padre Salgueiro - carta a Mme de Jouarre.

Fradique Mendes é uma personagem realista de Eça de Queirós que, descontente com a decadência de Portugal nas três últimas décadas do século XIX, saiu em incursão pelo mundo em busca não só do seu próprio reconhecimento como, também, da sua própria nação. Era, acima de tudo, um nacionalista que não suportava ver a sua pátria relegada a um limbo sem precedente. Diante de tal situação, Fradique voltou-se para o Portugal das grandes navegações com o objetivo de resgatar as raízes nacionais autênticas. Fradique, então, retomou o passado distante na expectativa de recuperar a verdadeira identidade portuguesa que outrora impulsionou outras civilizações a conquistar o mundo e a colonizar outras nações.

Fradique é a típica personagem representante de uma narrativa que rompe com a forma autoritária e fixa e, em vez disso, instaura-se a polifonia da narrativa contemporânea, que abre espaço a múltiplas vozes narradoras e – desafiando a estabilidade ilusória do romance realista – revela o sujeito textual como processo contraditório, lugar de contradição. É nesse espaço de contradição que Fradique dialoga com os grandes homens do seu tempo, onde várias vozes plenivalentes emergem acerca do mesmo problema. Através do diálogo que Fradique estabelece com os grandes homens do seu tempo, é possível saber, não só o que pensava Fradique, mas também o que pensavam todos os grandes homens do seu tempo sobre a crise pela qual passava Portugal. Fradique era um homem apegado à tradição de sua terra, sobretudo, à tradição desfigurada no decorrer do tempo.

Através de Fradique, Eça exprimiu também um amargo ceticismo perante angústias sociais para as quais não encontrou remédio.

Contexto histórico

É uma narrativa escrita nas últimas décadas do século XIX e abarca um conturbado momento histórico da sociedade portuguesa, sobretudo, no que se refere ao modelo liberal. A depressão que se instaurou no país causou a instabilidade e a rotatividade do poder. As contradições da monarquia constitucional começavam a se tornar evidentes para a nação. Esta situação acarretou transformações sociais, políticas e econômicas no país como a marginalização das camadas populares, o anticlericalismo como catalisador de descontentamento e de oposição às instituições vigentes, descrença nos governantes. Essas contradições terminam acentuando as diferenças de Portugal em relação aos demais países europeus. Portugal estava distante dos demais países da Europa.

Observa-se o esforço da personagem-narrador, Fradique Mendes, em firmar os valores de Portugal relacionados à cultura e aos costumes como valores sociais iguais enquanto nação que ocupa um espaço potencialmente privilegiado. As carências e as incertezas são decorrentes dessa contradição que, por sua vez, é o ponto central da obra A correspondência de Fradique Mendes. Elas acabam por acentuar as diferenças. Por conta disso, a consciência da marginalidade e da diferença constitui o principal foco de tensão, uma vez que acentua o sentimento de pessimismo4 no imaginário do povo, solapando a consciência de nacionalidade.

Um outro problema abordado na obra e que contribui, negativamente, para a consolidação da consciência nacional é a ausência de dirigentes com idéias originais e com aspirações voltadas para o povo. Tratam-se de questionamentos centrados nas motivações ideológicas que levaram a personagem-narrador a investir na desconstrução de mitos. Estamos, portanto, diante de textos dialéticos, nos quais a personagem-narrador revolve criticamente os problemas da realidade, vislumbrando através deles a razão de ser dos problemas do seu tempo. Desse modo, desvenda-se a situação contraditória.

Em A correspondência de Fradique Mendes, no espaço social de Portugal, a cultura e os fragmentos do passado permanecem vivos. A realidade do país, com seus costumes, suas normas, suas verdades essenciais é uma realidade carregada de episódios dramáticos, como se pode observar em carta de Fradique escrita a Madame de Jouarre.

Em meio à realidade rústica, os elementos próprios da terra são ressaltados, evidenciando o empenho de Fradique em deixar transparecer os valores firmados na cultura, na tradição, num realismo nacional. No plano da ficção, o rompimento dessa realidade banal se dá através da parodização da realidade histórica. O método dialógico é estabelecido através das estruturas ambivalentes. A ambigüidade se instaura pela associação metafórica. Dessa forma, rompe-se com as formas institucionalizadas e, em contrapartida, põe-se à mostra a luta pelos valores nacionais autênticos. A “densa treva” marca o obscurantismo daquela racionalidade, enquanto as “lanternas de faluas dormindo no rio”, os fragmentos da realidade nacional. Essas remetem, por associação, às antigas embarcações usadas para transportar mercadorias e pessoal. No entanto, já não existia mais o transporte de mercadorias e de pessoal, havia apenas por entre a densa treva “luzinhas remotas e vagas” remanescentes do Portugal antigo. Daí o fato de Fradique deixar entrever o ceticismo apreendido na história e o realiza, ocupando-se da ironia, do sarcasmo e do pessimismo.

A obra

A correspondência de Fradique Mendes compõe-se de duas partes distintas: uma narrativa e outra epistolar (cartas). A primeira parte, à guisa de “Notas e Memórias”, faz a apresentação biográfica de um suposto intelectual português Fradique Mendes.

Um narrador, que se presume ser Eça de Queirós, conta como, quando e onde conheceu “esse homem admirável”, com quem partilhou momentos de intimidade e por quem nutria a mais viva admiração. Mal se inicia o texto, atém-se o narrador à apreciação das LAPIDÁRIAS – cerca de cinco ou seis poesias, reunidas em folhetim, e sob esse título publicadas na Revolução de Setembro como da autoria de Fradique.

Segue-se um minucioso e completo relato sobre as LAPIDÁRIAS, com a introdução de duas personagens de apoio: J. Teixeira de Azevedo (Jaime Batalha Reis) e Marcos Vidigal, este, personagem ficcional, aquele, amigo e camarada de Eça desde a época do Cenáculo (1867). A essa altura do texto, sai de cena o narrador em primeira pessoa e entra outro narrador, agora em terceira pessoa onisciente, para contar a vida pregressa de Fradique. É com apoio no testemunho daquele último (Marcos Vidigal, que se confessa parente, patrício e parceiro de Fradique) que o narrador recompõe o passado do seu biografado. Finda a narrativa retrospectiva, é retomada em primeira pessoa a narrativa progressiva, dentro de um novo estatuto de narração em que se misturam os discursos indireto, direto e indireto livre, e assim até o final da primeira parte.

A segunda parte consta do epistolário (cartas) atribuído a Fradique, o qual se correspondia com vários amigos e eminentes intelectuais da época. Entre estes,
pessoas leais (como Antero de Quental, Oliveira Martins, etc.) e personagens fictícias. Como ensaiado na primeira parte, realidade e fantasia se alternam e
misturam, figurando o jogo entre o real e o irreal, jogo esse contido, pois, também na pretensa Correspondência.

São 16 cartas ao todo, coligidas sem qualquer critério aparente, com indicação apenas do lugar de procedência e do mês (“Londres, maio”, “Paris, dezembro”; etc.). Constituem “um conjunto de crônicas em forma epistolar”, na apreciação de Antônio J. Saraiva.1 Estas “cartas-crônicas” trazem o repertório das opiniões queirosianas acerca de arte, literatura, política, filosofia e religião. A propósito, afirma Feliciano Ramos que “na criação de A correspondência de Fradique Mendes, manifesta-se, não o paisagista ou crítico social, mas sim principalmente o ‘ensaísta’ com seu riquíssimo ideário”.

Efetivamente, nenhuma das cartas, nem mesmo as mais breves e despretensiosas (como a primeira, dirigida “Ao Visconde de A.-T”, recomendando-lhe o alfaiate Tomaz Cook) deixa de servir ao interesse maior de expressar uma opinião ou um gosto estético. No jogo que se estabelece entre a primeira e a segunda parte da obra, o leitor acaba por descobrir que o fingimento biográfico e o epistolar servem menos à fantasia do que à oportunidade de um debate sobre os diferentes temas aí versados. Entre estes, com destaque, o da criação literária.

Pela amostragem até aqui, pode-se verificar que o jogo ideológico se reflete na escrita, e deduz-se que Eça revela consciência do processo de construção desta sua obra, ao mesmo tempo que trabalha a linguagem com percepção de sua fragilidade como estabelecedora de sentido. A intenção metaliterária subjaz sob os aspectos meramente lúdicos, através dos quais Eça simula biografar “um grande homem”), documentando suas “Notas e Memórias” com depoimentos de amigos e uma coletânea de cartas atribuídas à excêntrica personagem biografada. Em conseqüência, A correspondência de Fradique Mendes se insere no conjunto daquelas obras em que Eça inscreve o legado de seu “testamento literário”.

Do exposto se deduz que A correspondência de Fradique Mendes não pode ser lida sem a percepção da malha irônica de que se entretecem as suas duas partes.

O próprio título já é irônico, tendo Eça hesitado entre (primeiro título) e Correspondência (título definitivo). Inicia-se, desse modo, a partir do título, a colocação do estatuto da palavra reversível e a perplexidade semântica como um pacto de jogo irônico.

A primeira parte contém várias incongruências (por ex.: o parentesco com Vidigal, o problema alfandegário com a múmia, etc.) que induzem o leitor à ironia, fazendo pensar que o autor não está falando sério, mas simulando um teatro de enganos. Além do mais, um intróito biográfico que já de início se põe a falar digressivamente de literatura (e as digressões literárias se repetem de tempo em tempo interferindo no andamento da narração) presta-se a informar o leitor de que Eça tenciona falar é de literatura, ou também de literatura. Em verdade o apresentador de Fradique simula biografar quando de fato intenta teorizar, e não apenas sobre arte, porém ainda sobre filosofia, política e religião.

O leitor mais atento, ou antes, interessado na problemática poética, com pouco percebe que o autor não só teoriza mas faz experimento, transformando sua narração em texto que se auto-exemplifica. Daí termos selecionado esse filete da metalinguagem de Eça para campo de nosso estudo e descobertas comparativas.

A correspondência de Fradique Mendes encerra um projeto metaliterário de singular importância para o entendimento do fenômeno da produção de textos e, mais significativo ainda, para a recepção da obra queirosiana, sobretudo a partir de Os Maias. As colocações e alusões contidas na primeira parte (à guisa de "Memórias e Notas”) mais a teorização literária, explícita e implícita nas Cartas de Fradique, produzidas já na maturidade de Eça, representam uma síntese expositiva e crítica das teorias vigentes, questionadas ou nascentes, a partir da segunda metade do Século XIX.

Fontes: Iara Regina Franco Rodrigues, Mestre em Letras (UFRGS) | Onofre de Freitas, Doutor em Letras: Estudos Literários (Área de concentração: Literatura Comparada) - UFMG.
 Site: http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/resumos_comentarios/a/a_correspondencia_de_fradique_mendes
http://manybooks.net/pages/queirozj2763727637-8/0.html

PARA COMPREENDER MELHOR O ESTILO METALINGUÍSTICO DE EÇA DE QUEIRÓS, VEJAMOS O SIGNIFICADO DESTA FIGURA:

Metalinguagem:


Metalinguístico: Função metalinguística é a função da linguagem pela qual o falante toma o código que utiliza como objeto de descrição, como como objeto do seu discurso, pelo menos num ponto de vista particular.
Meta Língua é uma lingua artificial que serve para descrever uma língua natural cujos termos são os da lí9ngua objeto de análise, mas que tem uma só acepção


Membros de frases como o que chamo X é Y, por exemplo, dependem da função metalinguística.(Metalinguístico)
Exemplo de Metalíngua:É por exemplo, a linguagem gramatical, de que serve o linguista para descrever o funcionamento da língua.
 http://www.dicionarioinformal.com.br/buscar.php?palavra=metalinguagem

Baixar aqui  A Correspondência do Fradique Mendes e outras obras.

Saudações Literárias

Pagu - Parte II - Homenagens

Coco de Pagu
Raul Bopp

Pagu tem os olhos moles
uns olhos de fazer doer.
Bate-côco quando passa.
Coração pega a bater.


Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.


Passa e me puxa com os olhos
provocantissimamente.
Mexe-mexe bamboleia
pra mexer com toda a gente.


Eli Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.


Toda a gente fica olhando
o seu corpinho de vai-e-vem
umbilical e molengo
de não-sei-o-que-é-que-tem.


Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.


Quero porque te quero
Nas formas do bem-querer.
Querzinho de ficar junto
que é bom de fazer doer.


Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.

Fonte:

http://www.revista.agulha.nom.br/rb.html#coco

Pagu... A Musa ex-interiorana
José Silveira

 izer que a obra dela é apócrifa,
Certamente, quem disser um louco é,
Coragem em um ser, maior não havia,
Ainda mais, no corpo tenro de uma mulher.

Musa brasileira, escandalosa e libertária,
Fenômeno, livre, sem atavismos, e independente,
A história está aí, e bem escrita,
Dos seus feitos, em variadas vertentes.

Uma modernista pro seu tempo,
Cuja voz doce ecoou forte, na rua,
Despojada, vestindo-se quase que nua,
Outros fatos a fez romper com a família.

Pós-menina e já era de vanguarda,
Pagú, pintou, fumou e abusou da lua,
Nada tinha de mulher interiorana,
Seus manifestos tinha-os sob sua guarda.

Por amor casou-se, e de igual amor gerou,
Pariu primeiro Rudá, qual o mito “o deus do amor”,
O mesmo amor com que o amou, ela amava,
A própria vida, e a liberdade do seu povo.

Engajou-se ao movimento antropofágico, de comer,
“no caráter metafórico da palavra”, não gente,
De não negar, mas não imitar culturas externas,
Dos ameríndios, euros e dos afros descendentes.

Mas, seu “Modus vivendi” incomodava,
Muito mais suas palavras às estruturas,
Sua escrita criticou todo o seu tempo,
Consuetudinário, de prisões e de torturas.

Aos cinqüenta e dois ano ela partiu,
Para viajem definitiva e derradeira
Ficou o mito, nunca será esquecida,
Pagú, a grande musa brasileira

Fonte:
http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=36192

Pagu

Rita Lee

Composição: Rita Lee e Zélia Duncan
Mexo, remexo na inquisição
Só quem já morreu na fogueira
Sabe o que é ser carvão
Uh! Uh! Uh! Uh!...
Eu sou pau prá toda obra
Deus dá asas à minha cobra
Hum! Hum! Hum! Hum!
Minha força não é bruta
Não sou freira
Nem sou puta...
Porque nem!
Toda feiticeira é corcunda
Nem!
Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem
Nem!
Toda feiticeira é corcunda
Nem!
Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem...
Ratatá! Ratatá! Ratatá!
Taratá! Taratá!...
Sou rainha do meu tanque
Sou Pagu indignada no palanque
Hanhan! Ah! Hanran!
Uh! Uh!
Fama de porra louca
Tudo bem!
Minha mãe é Maria Ninguém
Uh! Uh!...
Não sou atriz
Modelo, dançarina
Meu buraco é mais em cima
Porque nem!
Toda feiticeira é corcunda
Nem!
Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem...
Nem!
Toda feiticeira é corcunda
Nem!
Toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem...(2x)
Ratatá! Ratatatá
Hiii! Ratatá
Taratá! Taratá!... 

Pagu - Parte I

Caros Amigos, não poderia deixar de encerrar o mês de junho lembrando a nossa Pagu, a grande escritora, jornalista e militante política Patrícia Galvão (09/06/1910 - 12/121962).
Tantos artistas e escritores se inspiraram na história desta grande mulher para compor seus poemas, versos e cansões. Tantos outros anônimos sonhadores e mulheres lutadoras se espelharam na história de amor, luta, resistência, dor, fragilidade e coragem da nossa eterna Pagu.
Vejamos a seguir, algumas fortes e densas palavras da grande Patrícia Galvão, para que possamos reunir forças e seguir a nossa caminhada de Sonho e Resistência:



“Quando eu morrer não quero que chorem a minha morte/ Deixarei meu corpo pra vocês...”

" Dentro da lei...nha..."


"Se eu ainda tivesse unhas, enterraria meus dedos nesse espaço em branco que ainda resta"


"O apito da chaminé gigante, libertando uma humanidade inteira que se escoa para as ruas da miséria."


"De um país tão rico e importante, fizeram um país de sobremesas. Açúcar, café, bananas.
Que pelo menos nós sobrem as bananas!"


"Esse crime, o crime sagrado de ser divergente, nós o cometeremos sempre"

Nada, nada, nada
Nada mais do que nada
(...) Trouxeram-me camélias brancas e vermelhas
Uma linda criança sorriu-me quando eu a abraçava
Um cão rosnava na minha estrada
(...) Abri meu abraço aos amigos de sempre
Poetas compareceram
Alguns escritores
Gente de teatro
Birutas no aeroporto
E nada”

"É uma necessidade conversar com os poetas. E se os poetas morrerem, provocarei os mortos, as flores do mal que estão na minha estante."


" Quero ir bem alto... Bem alto! Numa sensação de saborosa superioridade... É que do outro lado do muro, tem uma coisa que eu quero espiar.. "

Cronologia

1910
9 de junho. Nasce Patrícia Rehder Galvão, filha de Thiers Galvão de França e Adélia Rehder Galvão, em São João da Boa Vista (SP).  O registro de nascimento é de 14 de junho, data às vezes erroneamente citada como a do nascimento.
1925
Primeiras colaborações no Brás Jornal; primeiro pseudônimo: Patsy.
Frequenta o Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, onde é aluna de Mário de Andrade e de Fernando Mendes de Almeida.
1927
Perde o Concurso Fotogênico de Beleza Feminina e Varonil, da Fox. Quem ganha é Lia Torá, o vencedor masculino é Olympio Guilherme, que parte para Hollywood. Antes, tivera um namoro com Patrícia.
1928
Vai às reuniões do casal Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral. Raul Bopp é quem a teria apresentado aos dois.
Bopp reivindica a criação do apelido Pagu (dado por achar que seu nome fosse Patrícia Goulart).
Recebe o diploma de professora na Escola Normal de São Paulo.
1929
Primeira colaboração na Revista da Antropofagia (um desenho, no número 2 da 2a “dentição”).
No número 8, publica novo desenho, assinado Pagu.
Produz o Álbum de Pagu – Nascimento Vida Paixão e Morte, composto de textos e desenhos humorísticos.
Começa o diário (com Oswald de Andrade), Romance da época anarquista ou Livro das horas de Pagu que são minhas. A data é 24 de maio, que Augusto de Campos afirma “poder ser o dia do início do romance entre os dois”.
Em 5 de junho, declama poemas modernistas numa festa beneficente, vestida por Tarsila.
Casa-se a 28 de setembro com o pintor Waldemar Belisário; o casamento é pró-forma. Após a cerimônia civil, Oswald recebe a noiva de Belisário, no alto da serra de Santos e, enquanto o pintor volta a São Paulo, Oswald e seu filho Nonê se juntam a Patrícia, rumo à praia. O casamento com Belisário seria anulado em fevereiro de 1930.
Inicia o Caderno de Croquis, com paisagens e cenários de cidades brasileiras.
1930
Oswald de Andrade e Patrícia Galvão fazem um casamento peculiar, no cemitério, diante do jazigo da família dele, em São Paulo, a 5 de janeiro.
Nasce Rudá de Andrade, filho de Oswald e Patrícia, a 25 de setembro.
Viaja em dezembro para Buenos Aires. Ali não consegue se encontrar com Luís Carlos Prestes, a quem conheceria depois, em Montevidéu, mas trava contatos com Jorge Luís Borges, Eduardo Mallea, Victoria Ocampo e Norah Borges.
1931
Entra no Partido Comunista Brasileiro.
Publica a seção A Mulher do Povo no jornal O Homem do Povo, que editou juntamente com Oswald. O jornal seria proibido pela polícia após oito números polêmicos que valeram o empastelamento do seu escritório por estudantes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo. No jornal também cria e desenha uma história em quadrinhos.
É presa, a 23 de agosto, em Santos (SP), ao participar de um comício em homenagem a Sacco e Vanzetti, quando um estivador negro morre em seus braços, fuzilado pela polícia getulista. É levada para o cárcere na Praça dos Andradas. A cadeia é hoje um centro cultural que leva o seu nome.
1932
Vai morar numa vila operária, no Rio de Janeiro, cidade em que trabalha como proletária em vários ofícios, entre os quais lanterninha de cinema e tecelã.
Debilitada e doente, é socorrida por Oswald.
Escreve o romance proletário Parque Industrial e peça de teatro nele baseada.
1933
Publica o romance Parque industrial, em janeiro. O livro, primeiro romance proletário brasileiro, tem edição financiada por Oswald e sai assinado por Mara Lobo, pseudônimo exigido pelo Partido Comunista.
Em agosto, começa viagem pelo mundo, enviando reportagens para jornais como o Diário de Notícias e o Correio da Manhã cariocas e o Diário da Noite paulistano. O itinerário: Rio, Belém, Califórnia, Japão, China, Rússia, Polônia, Alemanha, França. Encontros: Sigmund Freud num navio; George Raft, Raul Roulien e Miriam Hopkins, em Hollywood; Raul Bopp, em Cobe, no Japão.
1934
Fica amiga do último imperador, Pu-Yi, com quem anda de bicicleta pelos corredores do palácio da corte manchu. Consegue dele, na Mandchuria, as sementes de soja que iniciam a cultura do cereal no Brasil.
Após visitar a Rússia, mesmo decepcionada com o regime comunista, trabalha em Paris no jornal L’Avant-Garde e como tradutora de filmes. Com o pseudônimo de Léonie, entra para o PC francês. É ferida em manifestações de rua e presa três vezes. Encontros: a vanguarda francesa – Louis Aragon, André Breton, Paul Éluard, René Crevel, em casa da amiga e cantora brasileira Elsie Huston, casada com o poeta Benjamin Péret.
1935
A ponto de ser deportada para a Alemanha nazista, é salva pelo embaixador brasileiro Souza Dantas, que consegue recambiá-la para o Brasil. De volta, trabalha no jornal A Platéia, em São Paulo.
Separa-se de Oswald de Andrade.

1936

É presa por causa do levante comunista. Absolvida em São Paulo, é condenada a dois anos de prisão no Rio.

1937

Antes de cumprir toda a pena, foge do hospital Santa Cruz. Aparece nos jornais como uma mulher perigosa e inimiga pública do governo de Getúlio Vargas.

1938

Nova prisão. O Tribunal Nacional de Segurança do Estado Novo getulista a condena a mais dois anos de prisão.
1939
Escreve, na prisão, Microcosmo – Pagu e o homem subterrâneo. Correspondência, textos poéticos complementares (os únicos preservados) de romance que enterrou em terreno baldio, antes de ser detida, em São Paulo. No local foi construído um edifício, antes que pudesse desenterrar o romance.
1940
Começa a redigir, na cadeia, carta autobiográfica dirigida a Geraldo Ferraz, depois editada no livro Paixão Pagu.
É libertada e se casa com Geraldo Ferraz.
1941
Nasce Geraldo Galvão Ferraz, filho do casal, a 18 de junho.
1942
Em São Paulo, publica crônicas em A Noite, sob o pseudônimo Ariel.
1943
Trabalha nos jornais cariocas A Manhã e O Jornal.
1944
De junho a dezembro, escreve contos policiais para a revista Detective.
1945
Publica o romance A Famosa Revista, escrito com Geraldo Ferraz. No Rio e em São Paulo, trabalha na agência de notícias France-Presse, onde fica 11 anos.
Participa da redação do jornal A Vanguarda Socialista, fundado por Mário Pedrosa e secretariado por Geraldo Ferraz. Ali também publica crônicas políticas e literárias.
1946
Faz com Geraldo Ferraz o Suplemento Literário do jornal Diário de São Paulo.
Escreve crônicas da vida cultural na coluna Cor Local e produz a Antologia da Literatura Estrangeira, onde traduz pela primeira vez no Brasil grandes nomes da poesia e da prosa mundial.
1948
Importante participação no Congresso de Poesia, em São Paulo.
1949
Tentativa de suicídio. Colabora no Jornal de São Paulo.
1950
É candidata a deputada estadual em São Paulo, pelo Partido Socialista Brasileiro.
Publica o panfleto Verdade e Liberdade. Trabalha no jornal Fanfulla.
1952
Frequenta a Escola de Arte Dramática.
1954
Escreve a peça Fuga e Variações, parte do exercício escolar.
Traduz A Cantora Careca, de Ionesco.
Morando em São Vicente e Santos, trabalha no jornal A Tribuna.
1956
Começa uma das primeiras colunas de tevê no país com o pseudônimo Gim, em A Tribuna.
1958
Dirige, com Paulo Lara, Fando e Lis, de Fernando Arrabal.
Coordena o I Festival de Teatro Amador de Santos e Litoral. Incentivando o teatro de vanguarda.
1960
Encontros com Jean-Paul Sartre e Eugéne Ionesco, em São Paulo e Rio.
Traduz e dirige A Filha de Rappaccini, de Octavio Paz, em Santos.
1961
Traduz a peça O Túnel, de Par Lagerkvist.
1962
Em setembro, publica seu último texto, em A Tribuna, o poema Nothing.
Vai a Paris para uma operação. Tentativa de suicídio, após o fracasso da intervenção.
Morre em Santos, a 12 de dezembro.


Fontes e sugestões:

Mergulhem nesta história e construam suas narrativas únicas, infinitamente especiais!
Saudações Literárias